quinta-feira, 28 de abril de 2011

A BOA NOVA DA RESSURREIÇÃO

Ao ler o texto na Primeira carta de Paulo aos Coríntios, capítulo 15 e versículos 1 a 8, onde o escritor dá a conhecer a essência do evangelho aos crentes naquela cidade, fiquei a pensar na importância que a ressurreição de Jesus tem para os dias de hoje. Entretanto, lembrei-me que Thorwald Lorenzen, meu antigo professor de Teologia Sistemática quando fui aluno em Rüschlikon, Suíça, em 1985, escreveu um artigo para um livro em honra de um outro professor meu de Novo Testamento, Günter Wagner, sobre “Ressurrection and Discipleship” (Ressurreição e Discipulado).

Thorwald Lorenzen foi, para mim, uma das mentes mais competentes e meticulosas que eu já conheci e privei. Ele era de uma exigência implacável, querendo que os seus alunos desenvolvessem a sua capacidade de raciocínio ao máximo. Foi ele que me ensinou a saber ler, no sentido completo da palavra, o grande teólogo católico Karl Rahner. Quando tive as primeiras aulas com ele, um aluno mais antigo virou-se para mim e disse: “O Lorenzen é aquele tipo de professor semelhante a um pai, cujo filho chega a casa com 19 valores numa prova e ele pergunta, “Por que é que não tiraste 20?”.

Voltando ao tema da ressurreição, depois de passar a euforia das férias da Páscoa, achei por bem traduzir uma das partes do artigo que Thorwald Lorenzen escreveu para o dito livro, Festschrift Günter Wagner, Bern, Peter Lang, 1994, 92-94, porque as ideias ali expressas catapultam-nos para uma série de reflexões que cada um de nós deve procurar responder com aplicação à sua vida. A ressurreição de Cristo é, sem dúvida, uma boa notícia (evangelho) porque é um evento que está em aberto até à sua culminação, quando Deus quiser.



A Ressurreição como um Evento “Aberto”
“O encadeamento essencial entre a ressurreição e a nossa fé e o discipulado torna-se evidente quando reconhecemos que os cristãos primitivos narravam a ressurreição como um evento aberto – aberto para o futuro, procurando criar fé, e através dele moldar a história e assim determinar o futuro.

Esta abertura da ressurreição para o seu cumprimento futuro encontra expressão nas palavras cuidadosamente escolhidas de uma das fórmulas confessionais mais antigas, 1 Coríntios 15:3-5: ‘Cristo morreu (Tempo Aoristo)… foi sepultado (Tempo Aoristo)… tem sido ressuscitado (Tempo Perfeito)… foi visto (Tempo Aoristo)…”. O uso do tempo Perfeito para descrever a ressurreição sobressai aqui. Ele é usado intencionalmente para distinguir a ressurreição de Jesus Cristo da sua morte, do seu sepultamento e da sua aparição. Ele é usado para sublinhar o “efeito contínuo” do evento da ressurreição. Nas igrejas primitivas, o Cristo ressurrecto era chamado de “as primícias dos que dormem” ou “o primogénito dos mortos” (1 Cor. 15:20, 23; Col. 1:18; Apoc. 1:5; compare com Mat. 27:52s.). Mas como é que nós, que fazemos parte do processo histórico, podemos compreender um evento que está “em aberto”? Um evento que aponta para o cumprimento, quando o Filho triunfar, finalmente, sobre as forças alienadoras da morte, e quando ele entregar a autoridade que Deus lhe deu ao Pai, para que Deus seja verdadeiramente aquilo que é (1 Cor. 15:20-28). Como é que podemos saber e comunicar a ressurreição do Cristo crucificado como um evento único e escatológico, e ainda como um evento que mudou o mundo, que está a mudar o mundo e que mudará o mundo?

Para retratar a abertura da ressurreição, Jürgen Moltmann restaurou o conceito bíblico-teológico de “promessa”. Ele entende a promessa como um “evento-linguagem” de um tipo especial: ele (o evento) lembra, e como tal preserva a história, e ao mesmo tempo aponta para a actualização histórica concreta desta promessa na formação e antecipação do futuro.

Por isso, a ressurreição de Jesus Cristo exige uma forma de conhecimento que evita os extremos de um positivismo histórico, por um lado, e o existencialismo histórico, por outro. O positivismo histórico tende a absolutizar o passado congelando um evento no, assim chamado, passado objectivo. A ênfase está no que realmente aconteceu, e a resposta é uma afirmação teórica ou a negação desse facto. O existencialismo histórico tende a absolutizar o presente, estando primeiramente interessado no efeito de um evento no presente existente dos inquiridores e na sua situação vivencial.

O conceito de “promessa” lembra-nos que um evento histórico, que nós qualificamos como um acto de Deus, não pode ser propriamente compreendido por se fazer, meramente, uma afirmação teórica de que o evento aconteceu no passado, nem é suficiente experimentar o significado subjectivo, existencial ou psicológico de tal evento para a nossa vida. Para além deste conhecimento objectivo-intelectual e subjectivo-existencial, a realidade e o conteúdo do evento em si exige uma resposta holística em que se torna evidente que é Deus quem chama à obediência da fé, e ao mesmo tempo torna-se manifesto quem é este Deus que chama. Nós afirmamos tal evento como verdadeiro sintonizando a nossa vida com a história que esse evento está a criar e a moldar. Este é o conhecimento da praxis do discipulado, não da teoria. Estar relutante a comprometer-se com tal discipulado ou considerar esse discipulado como um extra opcional é questionar a verdade e a fidedignidade do evento.

A ressurreição é um acto de Deus. Como tal, não é um evento histórico que possa ser capturado com a razão histórica nem é um mito não-histórico que alude ao fenómeno da ressurreição geral na natureza e existência humana. É uma “promessa” que está ancorada no evento de Cristo, que exige pessoas, à semelhança de Moisés, Abraão e Paulo, que vão escorar a sua vida na promessa de Deus e assim vão participar na moldagem do futuro. A ressurreição é um evento criador da história. O assunto teológico controverso não é a ressurreição como tal. O que é controverso é como é que nós podemos conhecê-la como um acto de Deus, e que este Deus é Aquele que revela o seu poder ressuscitando o Cristo crucificado dentre os mortos.”

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